quinta-feira, 10 de setembro de 2009

ARTE NA PSIQUIATRIA: A REINVENÇÃO DO EU

Há algumas semanas, motivado tanto pela necessidade de aperfeiçoar meus conhecimentos como pela necessidade de dispor minhas habilidades para o bem estar do próximo, iniciei trabalho voluntário (oficinas arteterapêuticas) com um grupo de internas de um hospital psiquiátrico.
Desde sempre, ainda que intuitivamente, utilizei o fazer artístico em favor próprio, como forma de me encontrar e de expressar minha identidade no mundo. E desde sempre tem dado certo. Se tenho o auto-conhecimento necessário para lidar tranquilamente com minhas dificuldades, devo muito à livre expressão. Primeiro como autodidata, me graduei posteriormente como Arte-educador habilitado em Artes plásticas e mais recentemente, em busca de novas e mais práticas aplicações para os processos artísticos, me especializei em Arteterapia. E é na qualidade de Arteterapeuta e Arte-educador que, uma vez por semana, me reúno com o grupo citado acima para a realização de oficinas arteterapêuticas e arte-educativas, e passo aqui a publicar informalmente o andamento dessas oficinas. São oficinas que visam a busca do equilíbrio através da expressão artística livre, entre elas: pintura, desenho, modelagem, monotipia, produção de textos, dança e jogos teatrais. As técnicas vão sendo aplicadas de acordo com a necessidade e dinâmica do grupo, sempre levando em consideração as limitações físicas e cognitivas das participantes.

A impressão que tive do hospital psiquiátrico, o qual só conhecia da rua, foi de total estranhamento, estranhamento esse reforçado pelas inúmeras informações preconceituosas que tinha a respeito. Hospitais psiquiátricos sempre foram lugares esquecidos pela sociedade e ainda hoje, mesmo à luz dos novos paradigmas em tratamento de sofrimento mental, despertam o preconceito milenar da população.

As oficinas foram oferecidas, alguns minutos antes do início da primeira, a quem quer que se interessasse. Assim as expectativas das participantes seriam menores, fator importante para que não houvesse tensões. Eu não sabia o que encontraria e a maneira de me preparar para esta primeira sessão foi não me preparando, ou seja, me esvaziando de expectativas. Ao contrário do que tinham me alertado, as participantes me pareceram pessoas como outras quaisquer se considerarmos que todos temos problemas. A diferença é que os problemas delas são mais perceptíveis. Nota-se de imediato, na maioria, um comprometimento da razão. Os conteúdos inconscientes se fazem mais presente que os conteúdos conscientes. Segundo Jung, o transtorno mental nada mais é que a invasão do consciente pelo inconsciente, fenômeno que acontece em diferentes graus, a depender da fragiloidade do ego do indivíduo. Entre as partipantes há casos de depressão e agressividade sem motivos aparentes, tentativa de suicídio, ansiedade, dependência química entre outros.

As oficinas iniciam-se sempre com uma roda de conversa, um momento imprevisível onde contam os acontecimentos marcantes da semana. É nesse momento que consigo perceber as necessidades imediatas do grupo. Todas, sem excessão, se mostram fragilizadas pela ausência da família (filhos, marido, pais, irmãos...), altamente carentes e ansiosas. Em vista desse momento aplico exercícios corporais que vão de encontro às necessidades das participantes enquanto grupo homogêneo e em seguida partimos para a parte plástica, onde cada uma expressa livremente a sua individualidade através da criatividade. Fizeram já colagem, desenho livre, monotipia e mandalas. Talvez o único momento dessa luta diária a que estão submetidas que decidem por si mesmas sem receios, expressando sua individualidade e experimentado o equilíbrio. Esses exercícios plásticos servem também como diagnóstico, é onde consigo fazer uma leitura mais individualizada de cada participante, tentando, na sessão seguinte, direcioná-la à medida do possível, caso ela retorne. Uma das características do grupo é a rotatividade, o que me obriga a realizar oficinas com começo, meio e fim. Algumas pacientes nunca deixam de comparecer, mas considero que a qualquer momento podem ter alta ou não estarem dispostas a participar, já que a participação é voluntária.

A análise dos trabalhos deixa claro que a família e as relações possibilitadas por esta está no centro dos conflitos, o que é notado na representação gráfica da casa que, segundo os dicionários de símbolos de CHEVALIER E GHEERBRANT, simboliza as relações familiares, desde as mais satisfatórias até as mais conflituosas. Outra figura representada à exaustão é a árvore, que simboliza o próprio eu, o renascimento desse eu. Outra característica que se nota nos trabalhos analisados até agora é a falta de bases. Os desenhos flutuam sem chão, o que reflete o momento em que se encontram, perdidas e desorientadas, com dificuldade de contato com a realidade. Mais um indício da invasão do consciente ( realidade) pelo insconsciente (fantasia).

Com base na análise dos trabalhos, tenho buscado técnicas que possibilitem a exteriorização espontânea dos conteúdos inconscientes, de modo que possam ser compreendidos numa relação de diálogo consigo próprio. A monotipia se prestou muito à esse objetivo (verabaixo), pois utilizei tinta para tecido de secagem rápida, o que não permitiu grande planejamento mental, além de não permitir correções. Os resultados foram surpreendentes e entusiasmantes para elas que se encantaram ao entrar em contato com algo desconhecido, dominando-o. Outra atividade que se faz necessária e tem surtido bons efeitos são os exercícios de self-healing (www.self-healing.org.br),que ajudam a despertar o corpo e a mente, possibilitando uma conexão entre todas as funções do organismo. Busco também exercícios que as façam "sentir" o chão apropriando-se desse espaço de equilíbrio que pertencem e têm direito. Pretendo experimetnar a música tribal acompanhada de instrumentos como tambor ou algo similar. A maioria delas se movimenta de forma muito lenta e com alguma dificuldade, temendo existir. E existir é nada mais que exteriorizar-se por inteiro. Assim sendo, essa dificuldade está diretamente relacionada à incapacidade de lidar com os conteúdos inconscientes que se fazem presente nesse momento. Se temo exteriorizar-me contenho meus movimentos, uma vez que, se não verbalizo o corpo fala.

Abaixo, alguns trabalhos realizados até agora.


monotipia

monotipia

monotipia


pintura livre

monotipia


monitipia


pintura livre

pintura livre

Em breve, mais informações.

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